sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Correr...






Eis que encontro uma saída para a angústia e a tensão que me assaltam dia sim, dia não: correr.
Isso mesmo, sair correndo e deixando para trás o medo, a solidão, a melancolia, o estresse e tudo aquilo que aflige, atormenta e faz minha cabeça, às vezes, parecer um pesado fardo a carregar, e meu corpo, um desagradável estranho nessa mesma cabeça.

Saio correndo, sem olhar para trás, imerso em músicas (im)pulsantes e cheias de forte percussão, tento acompanhar com passos rápidos, saltos firmes e cabeça erguida.
A Sensação de cansaço faz da corrida um desafio a vencer. Por que? Vencer o próprio corpo pelo mero simbolismo dessa atividade. Ou seja, superar os seus limites significa nada menos do que aprender a superar dificuldades.

Começo a correr e logo sinto dor na base de minhas pernas. Insisto, meu corpo se acostuma, e a dor passa. Continuo a correr e logo ouço minha respiração ofegante dizendo: "chegaaaaaaa". Primeiro reflexo: preciso parar, não agüento mais!"...

Uma certa dose de orgulho e vaidade faz com que eu diga a mim mesmo: "Insista, o pior já vai passar". Insisto e percebo que meus músculos aos poucos aceitam a adversidade da situação. Aos poucos essa dificuldade dá lugar a momentos de prazer e transcendência. Começa-se vencendo a preguiça.
Depois, se superam a dor e o cansaço físico. Atingindo esse estágio, corpo e mente encontram uma estável harmonia. A luta árdua deixa de existir, agora, inicia-se um processo que se pode chamar de inércia espacial. É como se os pés fossem absolutamente autônomos.

Continua-se a correr simplesmente porque assim o fazem os pés. A mente apenas acompanha espacialmente o que as pernas executam. Nesse ponto, a cabeça começa um delicioso processo de abstração crescente.
Antes dessa harmonia, a mente encontrava-se em uma suada e objetiva luta com o corpo: "Continue, vai, você vai conseguir!” Não, não vou deixar esse calor todo me derrubar, não vou deixar influenciar por esse coração que bate com tanta pressa e atrevimento, não, não, vou VENCER, vou abraçar esse cansaço, vou fazer dessa luta uma dança, vou conseguir...E, de repente, eis que o corpo continua a correr, mas agora o faz como se o único destino fosse correr, como se sempre estivesse correndo, como se o corpo fosse o correr.

A velocidade aumenta, e a cabeça apenas orbita em torno do próprio corpo. É como se corrêssemos no vazio. O corpo corre, e meu eu flutua em doidas e distantes divagações. O Corpo dá voltas no mundo todo, e a mente deixa-se invadir por sensações que ultrapassam as dimensões habituais do corpo e se distanciam delas.
E, nessa altura, nem mesmo a música é necessária, apesar de muito bem-vinda. Afinal, estando-se no espaço, não há lugar para o som nem para a gravidade. Ou seja, agora o que domina é a sensação de leve e surpreendente deleite.

Foi assim que comecei a correr, deslumbrado e estimulado pelo sabor de novas sensações. 

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